Janete Capiberibe pede instalação da Comissão da Verdade
Correa Neto.com.br
“Esta Casa tem obrigação de dar um grande passo em favor da história do Brasil e em favor da democracia. Esta Casa tem o dever cívico e o dever moral com os mortos e perseguidos pela ditadura militar de colocar em pauta e aprovar o Projeto, que cria a Comissão da Verdade. Democraticamente eleito, o Governo Federal está disposto a reescrever — em defesa da democracia, da justiça e da verdade — aquelas páginas censuradas e manchadas com sangue da nossa história”, discursou a deputada.
O Projeto de Lei nº 7.376, de 2010, aguarda que a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados determine a instalação da Comissão Especial para analisá-lo. Depois, deverá ser aprovado pelos plenários da Câmara e do Senado Federal.
A deputada Janete Capiberibe recordou o exílio vivido por ela, com sua família, e a luta pela democracia. “Ainda estamos às voltas com perseguições políticas, defesa da segurança jurídica e da constitucionalidade. Na última eleição, fui eleita mais uma vez — a Deputada Federal mais votada pela 3ª vez consecutiva – , mas só tomei posse em julho passado, após decisão do Supremo. O Senador Capiberibe, por sua vez, aguarda que o TSE acate a decisão do STF para ser diplomado e tomar posse no Senado Federal, no mandato para o qual foi eleito”, cobrou a socialista.
Janete Capiberibe propôs, ainda, um boicote às grifes que usam mão de obra escrava na confecção de roupas, conforme notificações do Ministério Público do Trabalho e da Superintendência do Trabalho e Emprego de São Paulo.
Leia, abaixo, a íntegra do discurso que a deputada socialista proferiu no plenário.
O SR. PRESIDENTE (Onofre Santo Agostini) – Concedo a palavra à nobre Deputada Janete Capiberibe, para uma Comunicação de Liderança, pelo PSB. S.Exa. dispõe de 8 minutos.
A SRA. JANETE CAPIBERIBE (Bloco/PSB. Como Líder) – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Parlamentares, comemoramos na quarta-feira, dia 24, os 10 anos da Comissão de Anistia, criada em 2001, por medida provisória do Presidente Fernando Henrique Cardoso, e aprovada, por unanimidade, por esta Casa no ano seguinte.
A Comissão de Anistia foi instaurada para julgar os requerimentos de reparações e formalizar o pedido de desculpas do Estado brasileiro pelas arbitrariedades que cometeu durante a ditadura militar.
Da estimativa inicial de julgar 10 mil pedidos, quando da sua criação, já julgou atéagora seis vezes mais: 59 mil dos 70 mil processos protocolados, 65% deles foram deferidos. Destes, 24.400 receberam declaração de anistia e restituição de direitos. Outros 13.500 também receberam reparação econômica, com prestação mensal ou prestação única.
O meu processo e o do meu companheiro de luta e vida, João Capiberibe, foi deferido pela Comissão da Anistia e publicada no Diário Oficial da União em 1º de fevereiro passado.
Por defendermos a democracia contra a ditadura capitalista militar, fomos perseguidos, presos e obrigados a deixar o País e viver, durante 9 anos, no exílio. Deixamos o Brasil, eu, o meu companheiro João Capiberibe, a minha filha mais velha, a Artionka, ainda no colo, com 8 meses de idade. Luciana e Camilo, hoje Governador do Amapá, nasceram no Chile.
Na segunda-feira desta semana, na cerimônia promovida pelo Ministério da Justiça, pela Comissão da Anistia, o Governador Camilo Capiberibe esteve presente e se emocionou muito. Essa é uma questão muito forte na vida de homens, mulheres, idosos e crianças que nasceram no exílio e não tinham sequer direito a ter uma documentação durante todo aquele período.
Logo depois tivemos que escapar de nova perseguição da nova ditadura, patrocinada pelos Estados Unidos. As ditaduras assolaram a América Latina nas décadas de 70 e 80.
Voltamos ao Brasil em 1979, com a Lei da Anistia, que serviu principalmente para perdoar os crimes dos integrantes do regime de exceção, que perseguiram, torturaram e mataram quem defendia a democracia no Brasil. Voltamos ao Amapá, nosso Estado de origem, na década de 80, onde construímos a nossa vida política e vivemos até hoje.
No Amapá fui eleita Vereadora da capital. Fui eleita, para 3 mandatos, Deputada Estadual. Fui Secretária de Estado da Indústria e Comércio e eleita, pela terceira vez, a Deputada mais votada pelo povo do meu Estado.
Ainda estamos às voltas com perseguições políticas, defesa da segurança jurídica e da constitucionalidade. Na última eleição, fui eleita mais uma vez — a Deputada Federal mais votada pela 3ª vez consecutiva –, mas só tomei posse em julho passado, após decisão do Supremo.
O Senador Capiberibe, por sua vez, aguarda que o TSE acate a decisão do STF para ser diplomado e tomar posse no Senado Federal, no mandato para o qual foi eleito.
Nós, ele e eu, consideramos que essa é uma terceira cassação imposta nas nossas vidas, nas nossas carreiras políticas, no nosso País. A primeira foi a prisão, a tortura, o exílio de 9 anos; a segunda foi em 2004, quando tivemos nossos mandatos cassados, eu e o Senador Capiberibe, com provas ridículas que foram apresentadas para nos retirar do Congresso Nacional, para calar nossa voz. A nossa voz representa a voz do povo brasileiro, a voz do povo do meu Estado do Amapá.
É necessário que o Senador Capiberibe, eleito pela segunda vez Senador da República pelo povo do Estado do Amapá, seja diplomado e assuma a sua cadeira no Senado da República.
Na segunda-feira, dia 22, fomos homenageados durante evento intitulado Anistia Política, Educação para a Cidadania, Democracia e Direitos Humanos, realizado pelo Governo do Estado do Amapá, por meio da Escola da Administração Pública, EAP, junto com o Ministério da Justiça, como parte da programação de 10 de criação da Comissão de Anistia.
Outros 22 Estados e o Distrito Federal realizam a Semana da Anistia, para avivarmos um período da história que não queremos ver repetido. Em todos esses eventos celebramos a resistência de todos nós que não admitimos a intolerância, o arbítrio e o abuso de poder.
Mas falta outro passo significativo, Sr. Presidente, que esta Casa tem obrigação de dar em favor da história do Brasil e em favor da democracia. Esta Casa tem o dever cívico e o dever moral com os mortos e perseguidos pela ditadura militar de colocar em pauta e aprovar o Projeto de Lei nº 7.376, de 2010, que cria a Comissão da Verdade.
Esta Casa não pode se omitir nem permitir perpetuar, para as gerações futuras, as mentiras de um regime de exceção, como se estas mentiras fossem verdade.
A Comissão da Verdade permitirá reescrever a história do Brasil. Os algozes do povo brasileiro durante vinte anos não podem ser conhecidos como heróis Épreciso ser de conhecimento de todos, hoje e no futuro, que o Estado brasileiro foi tomado de assalto, pelas armas, destituindo-se um Presidente democraticamente eleito.
Com o golpe militar, o Estado tornou-se algoz do seu próprio povo para perpetuar a desigualdade social, a concentração de renda e o empobrecimento da maioria da população.
O Estado usou as ferramentas institucionais para oprimir, massacrar e promover o enriquecimento de uns poucos, apadrinhados pelas armas do poder.
Essa é a verdadeira história do Brasil, Sr. Presidente, a história do povo brasileiro, muitos dos quais deram tudo de si, inclusive sua vida, para retornarmos à democracia, apesar dos prejuízos de mais de 20 anos de escuridão e atraso.
Democraticamente eleito, o Governo Federal está disposto a reescrever — em defesa da democracia, da justiça e da verdade — aquelas páginas censuradas e manchadas com sangue da nossa história.
Esta Casa, representante legítima do povo brasileiro, que fora fechada e destituída de poder durante a ditadura, não se omitirá com certeza.
Sr. Presidente, antes de concluir, solicito mais um minuto para falar sobre o trabalho escravo constatado pela Superintendência Regional de Trabalho e Emprego de São Paulo em confecções da grife Zara.
Outras marcas famosas — Ecko, Gregory, Billabong, Brooksfield, Cobra dÁgua e Tyrol — terão que se explicar e assinar Termo de Ajustamento de Conduta no Ministério Público do Trabalho também por trabalho análogo à escravidão nas suas confecções.
Desde o ano passado, Sr. Presidente, mantenho boicote às lojas Marisa, também por causa do trabalho escravo.
Proponho um boicote a essas grifes pelo desrespeito aos direitos humanos e dos trabalhadores e pela a má fé com que tratam seus clientes, induzidos a comprar produtos oriundos de trabalho escravo.
Anexo a meu discurso matéria que saiu na mídia, no jornal O Globo e Folha de S. Paulo
E solicito, Sr. Presidente, que seja feito o registro desta minha fala, principalmente no que diz respeito à Comissão de Anistia e à sua atuação.
Solicito, por fim, que seja publicado no Jornal da Câmara um resumo desta minha fala, além da divulgação no programa A Voz do Brasil.
Muito obrigada, Sr. Presidente.
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