domingo, 14 de agosto de 2011


Biografia traça perfil de Roman Polanski a partir das várias tragédias de vida



Há uma frase famosa do diretor Roman Polanski que expressa bem como ele se sente em relação à opinião pública e à forma como o público não se priva de avaliar alguns fatos marcantes de sua história. Ele disse, numa entrevista: “Eu gostaria de ser julgado pelo meu trabalho e não pela minha vida.” O ponto é que o trabalho de Polanski inclui filmes clássicos como “Repulsa ao sexo” (1965), “O bebê de Rosemary” (1968), “Chinatown” (1974) e “O pianista” (2002); enquanto sua vida passa por tragédias e polêmicas, como a morte de sua mãe em Auschwitz, o assassinato de sua mulher Sharon Tate pela seita do maluco Charles Manson e a acusação de ter estuprado uma menina de 13 anos, um caso que perdura até hoje e que recentemente colocou o diretor em prisão domiciliar na Suíça. Para ele, mais do que para muitas personalidades de nosso tempo, ambos os elementos, o profissional e o pessoal, se misturaram. E é disso que trata “Polanski — Uma vida”, biografia do britânico Christopher Sandford que a editora Nova Fronteira acaba de lançar no Brasil e que indica que o cineasta, acima de tudo, sempre foi um fugitivo.
Polanski nasceu em 18 de agosto de 1933, em Paris. Seu pai era um imigrante polonês que foi da Cracóvia para a França com o sonho de se tornar pintor, e sua mãe era uma russa divorciada. A família, porém, resolveu voltar para a Polônia em 1936, uma decisão equivocada que marcaria o pequeno Roman. Eles eram judeus, e a guerra se aproximava.
Após ser expulso do jardim de infância por dizer, em sala de aula, ao lado de seus jovens coleguinhas, a frase “beije o meu traseiro”, Polanski recebeu educação domiciliar de sua meia-irmã adolescente, que era quem também o levava ao cinema. O menino gostava, ainda, de colecionar borboletas e de desenhar. Mas tudo mudaria a partir de 1939, com a tomada da Polônia pelas tropas de Hitler. Muitos dos acontecimentos vividos por Polanski naquele período de guerra retornaram 63 anos depois em “O pianista”, como na cena real e da ficção em que sua família precisou revirar latas de lixo e sobreviver por dias com uma jarra de picles.
Sua mãe foi levada para Auschwitz em 1943 e terminou morta junto aos 980 mil judeus nas câmaras de gás. Seu pai acabou preso no campo austríaco de Mauthausen-Gusen, mas sobreviveria. Aos 9 anos de idade, Polanski ficou sozinho e só escapou graças à acolhida de famílias católicas da Polônia que escondiam suas origens.

Confira trecho da obra
As filmagens de Chinatown começaram em 28 de setembro de 1973, o dia mais quente de início de outono já registrado no local. Fazia 35 graus quando o elenco se reuniu em um pomar de laranjas perto de Pasadena para dar início aos trabalhos. Um Polanski "elétrico" saltou de seu carro com motorista, vomitou e começou a trabalhar. Embora a temperatura viesse a cair na semana seguinte, a produção se mostraria agonizantemente lenta, até mesmo para um filme conscientemente cadenciado. Polanski acabou por concluir que a culpa era de Stanley Cortez, o velho cameraman de 64 anos a quem achara "cheio de charme à moda antiga" mas "completamente por fora" dos avanços tecnológicos pós-guerra. Ao chegarem ao nono dia de filmagens, Cortez foi despedido. Para seu posto Polanski chamou John Alonzo, um indivíduo extremamente autoconfiante, além de enérgico operador de câmara e ator que havia feito uma participação memorável em Sete homens e um destino. Com sua ajuda, Chinatown se tornaria o segundo filme consecutivo em que Polanski chegaria ao final antes do que previa o cronograma.
A saída abrupta de Cortez parece ter irritado alguns membros da equipe de Chinatown, que já trabalhavam seguindo a cartilha de Polanski, com longas e cansativas jornadas. Um técnico em particular, que prefere permanecer anônimo, admite ter sido um "amotinador" que tentaria organizar uma petição contra o diretor, mais especificamente seu hábito de exigir inúmeras tomadas, se necessário "bem além do horário de trabalho". Tal protesto parece ter atingido o âmago da questão, comum em muitas filmagens, sobre quem de fato estava no comando. Ao tomar conhecimento do caso, Robert Evans teria chamado certa noite o funcionário descontente em seu escritório e lhe oferecido uma escolha: "Você prefere rasgar seu contrato e ir para o olho da rua ou fazer as pazes com Roman?". Diante de tais alternativas, o homem lhe perguntou como poderia apresentar seu pedido de desculpas. "Apenas vá até ele e diga: ′Sr. Polanski, me perdoe. Sou um babaca.`" Aquilo parece ter funcionado.
Da Agência O Globo